sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Um certo vazio

Pequena era a casa de Alciano. Não cabia cama nem guarda-roupa. Pela porta não passava mesa, nem geladeira. Nem para um chuveiro se dava jeito. Namorada, nem se contorcionista, ou de circo, arranjava lugar. Na falta de companhia tentou um cachorro, mas com o espaço da casa não havia acordo. Pastor-alemão, pinscher, ou pote de ração, nem se apertasse. O pobre homem um dia quisera aprender música, mas de violão à cavaquinho, de piano à acordeom, nada entrava ali, nem se quer triângulo ou tamborim. Não podia também passar o tempo lendo, dicionário, revista, jornal ou livro de bolso, por mais que se lutasse, em vão era o esforço. Por incrível que pareça, na casa de Alciano só cabia Alciano. Mais nada. Nem sua imundície ou higiene, saciedade ou fome, sono ou vigília, vontade ou fadiga, alegria ou tristeza, sonhos ou desilusões, lembranças ou esquecimentos, qualquer forma de pensamento. Tudo isso, na medida em que na casa o homem entrava, simplesmente, perdia-se com o vento.